A neve caía pesada sobre Stalingrado em 1942 quando Lena, uma jovem enfermeira do Exército Vermelho, correu para dentro de um prédio destruído, seguindo os gritos abafados por explosões. Ela já não lembrava a última vez que dormira mais de duas horas, mas ainda segurava firme a maleta de primeiros socorros — era tudo o que garantia que ainda tinha algum propósito no meio daquele inferno.
Dentro do prédio, encontrou apenas um soldado alemão ferido, encostado à parede, pálido demais para continuar odiando alguém. Ele levantou as mãos, trêmulo, como quem pede desculpas por existir. Lena hesitou; a guerra lhe ensinara a escolher lados, mas os olhos daquele homem pareciam segurar algo que a guerra tentava apagar: medo, não maldade. Com as bombas aproximando-se, ela se ajoelhou, limpou o sangue de seu ombro e improvisou um curativo.
Por alguns minutos, um estranho silêncio pairou entre os dois, como se a cidade tivesse prendido a respiração. O soldado tentou agradecer em um russo desajeitado, mas a frase se perdeu em tosses. Lena segurou sua mão, mais para lembrá-lo de que não morreria sozinho do que por piedade. A guerra rugia lá fora, indiferente ao gesto pequeno, quase invisível, que acontecia ali.
Antes de partir, ele lhe entregou uma pequena fotografia amassada — uma menina rindo sob o sol, provavelmente sua filha. Lena guardou a foto no bolso do casaco e saiu correndo quando as paredes começaram a tremer. Nunca soube se ele sobreviveu. Mas, nas noites mais silenciosas, quando o barulho das bombas dava lugar às memórias, Lena olhava para a fotografia e tentava acreditar que, apesar da guerra, ainda havia um fio de humanidade capaz de atravessar fronteiras que ninguém escolheu criar.
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